A controvérsia do uso de colóides ou cristalóides parece não terminar. Por mero acaso, encontrei um estudo bastante extenso e de impacto significativo, em que o objectivo foi estabelecer um paralelismo entre a mortalidade de doentes em estado crítico e a administração de colóides vs cristalóides.
Achei interessante este estudo pelo facto de apresentar uma amostra significativa:
Subjects: 37 randomised controlled trials were eligible, of which 26 unconfounded trials compared colloids with crystalloids (n=1622). (The 10 trials that compared colloid in hypertonic crystalloid with isotonic crystalloid (n=1422) and one trial that compared colloid in isotonic crystalloid with hypertonic crystalloid (n=38)
Com um objectivo bastante ambicioso, a intenção seria definir qual dos fluidos optar, independentemente da situação clínica que propiciou o estado crítico, que segundo estudo, incluía casos cirúrgicos, trauma, queimados, choques sépticos e ARDS.
Como resultados, verificou-se que o emprego de colóides, em situação de reanimação, estava associado a uma mortalidade de 24%, ao passo que na administração de cristalóides a estatística rondava os 20%. Ou seja, existe uma mortalidade acrescida de 4% no uso de colóides comparativamente com o emprego de cristalóides, independentemente do tipo de injúria que provocou a situação crítica.
Ora, como não existe evidência de uma eficácia significativa por parte dos colóides e, considerando que estão associados a uma despesa muito superior comparativamente aos cristalóides, a questão que se coloca é: “porque ainda fazem parte de várias guidelines e algoritmos de ressuscitação?”
No final da década de 80, estudos comprovavam que existia selectividade na eficácia de ambos:
The overall treatment effect when the data from all the clinical trials were pooled showed a 5.7% relative difference in mortality rate in favor of crystalloid therapy. When the data from only those studies using trauma patients were pooled, the overall treatment effect showed a 12.3% difference in mortality rate in favor of crystalloid therapy. However, when data from studies that used nontrauma patients were pooled, there was a 7.8% difference in mortality rate in favor of colloid treatment.
(in http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/entrez?cmd=Retrieve&db=PubMed&list_uids=2911805&dopt=AbstractPlus)
Os estudos mais recentes demonstram que, em traços gerais, o importante não é o tipo de fluído que é administrado, mas sim a reposição do volume. A actuação imperativa é a manutenção de volume circulante para garantir o transporte de oxigénio no organismo. Contudo existe uma selectividade no tipo de volume a utilizar dado que:
- Existe maior eficácia dos cristalóides na reposição do volume intersticial;
- Existe maior eficácia dos colóides na reposição do volume intravascular;
- O uso de cristalóides aumenta o risco de edema pulmonar e edemas periféricos, afastando as células dos capilares, traduzindo-se num aumento do risco de hipoxia celular (que não ocorre com tanta frequência com os colóides dado que o risco de edemas é menor);
- A hipercoagulação está associada ao uso de cristalóides, que em casos de choque séptico potencia a coagulação intravascular disseminada;
- O uso de cristalóides em grande escala potenciam a acidose metabólica;
(in Hillman K. Colloid versus crystalloids in shock. Indian J Crit Care Med 2004;8:14-21)
A minha conclusão: a controvérsia vai continuar...